August 24, 2009

Presidente Sarney, um município entre os piores

Terra natal de senador tem baixos índices em saúde e renda

Raimundo Garrone* Enviado especial


Crianças na caminhonete que serve de transporte escolar
(foto de Gilson Teixeira)

PRESIDENTE SARNEY (MA). Ao ser emancipado em 1997, o povoado de Pimenta, no município de Pinheiro (MA), mudou de nome, mas não atraiu o interesse do homenageado por sua terra natal. Hoje, Presidente Sarney amarga uma das piores posições no Índice Firjan de Desenvolvimento Municipal (IFDM).

Dos 5.560 municípios brasileiros, ele está em 5.542º lugar no IFDM, que mede dados de emprego, renda, saúde e educação.

Dos presidentes homenageados no Maranhão (Dutra, Juscelino, Vargas e Médici), Sarney é o pior colocado. Mas a pobreza não se limita ao município que leva o nome do atual presidente do Senado. Das 20 piores colocações no IFDM, sete estão no Maranhão, governado há 40 anos pela família Sarney ou seus aliados, com breves interrupções.

Presidente Sarney não tem abastecimento de água e depende dos poços de algumas casas e do da praça, que é perene. A esperança é a ligação com o Rio Turi, distante nove quilômetros.

— Aqui tem muito cano enterrado.

Os políticos dizem na campanha que vão trazer água, mas ela só chega no inverno — diz Oswaldo de Jesus Souza, de 62.


O lixo é recolhido de tres em tres dias.

(foto de Gilson Teixeira)


Na única avenida da cidade, lixo e animais soltos
'Emprego, só na prefeitura e se for aliado do prefeito'

Sem saneamento básico, água encanada, emprego e hospital, Presidente Sarney é o retrato do abandono. Porcos, bois, cavalos, cachorros e bodes passeiam pela única avenida da cidade, a Padre Rios, onde também se acumula o lixo, que só é recolhido de três em três dias. A secretária de Saúde do município, Jamily Soares, conta que todas as crianças têm vermes.

A população enfrenta outras doenças da pobreza, como tuberculose e desnutrição. O atendimento é apenas ambulatorial.

Os partos são feitos na cidade vizinha de Pinheiro, e casos graves têm de ir para a capital, São Luís, a mais de 80 quilômetros e ainda 90 minutos de barco.

No quesito emprego e renda, Presidente Sarney tem a pior nota do IFDM: 0,0782. Pela pesquisa, até 0,4 está abaixo da linha de desenvolvimento. Farinha de mandioca e pesca são as principais fontes de renda. Muitos homens partem em busca de trabalho, deixando as famílias.

— Emprego aqui, só na prefeitura e se for aliado do prefeito — diz Oswaldo de Jesus Souza.

Escola funciona em uma antiga estrebaria A falta de perspectiva começa na escola. A única de ensino médio tem 900 vagas e funciona à noite em salas emprestadas pela prefeitura ao governo do estado.

As condições das 54 escolas são precárias. Na comunidade do Pirinã, a 13 quilômetros, os alunos estudam em uma antiga estrebaria, coberta de palha.

— Os pais preferem isso a colocar seus filhos em risco nessas (caminhonetes) D20 que fazem o transporte escolar — explica o líder comunitário Raimundo de Moraes, enquanto as crianças pedem um ônibus.

A Secretaria de Educação do município explica que os recursos para o transporte escolar estão bloqueados no Ministério da Educação porque a administração anterior não prestou contas.

Já a biblioteca pública não tem previsão de funcionamento.

— Fizemos um ofício em março para o gabinete do senador Sarney, pedindo ajuda para conseguir um acervo para nossa biblioteca, e sequer recebemos resposta — lamenta a chefe do gabinete da Secretaria de Educação, que se identificou apenas como Iranilde.

(Raimundo Garrone, especial para O GLOBO)

Veja mais fotos de Presidente Sarney no Extra Online


VOLTAR PARA O BLOG0NEWS



August 20, 2009

Jornal move ação contra blogueiro


Sérgio Matsuura, de São Paulo

“A livre manifestação de pensamento não é direito que pode ser exercido de modo absoluto e sem restrições”. Essa passagem é praxe em processos contra veículos de comunicação. Entretanto, ela foi retirada de uma ação movida pelo jornal Folha da Manhã, de Campos dos Goytacazes (RJ). O réu é o blogueiro Roberto Moraes. O motivo: dois comentários postados por leitores no blog.

“Ao autorizar a postagem e divulgação de comentários que depreciam e violam a honra da Autora, ainda mais quando mencionadas acusações despidas de veracidade, o Réu carreia para si a responsabilidade de indenizar a Autora nos danos morais por esta experimentados”, diz a ação, que pede a retirada dos comentários sob pena de multa diária de R$ 1 mil.

O jornal também pede que o blogueiro “se abstenha de autorizar postagem de comentários depreciativos à honra da autora”.

“Isso é censura prévia. É muito estranho um veículo de comunicação querer calar alguém”, afirma Moraes, que, além de blogueiro, é professor no Instituto Federal Fluminense.

Em sua opinião, interesses econômicos estão por trás da ação movida pelo jornal. Segundo ele, a Internet criou um espaço que não foi ocupado pelos veículos tradicionais e, agora, os jornais estão tentando reaver esse lugar.

“Isso é uma tentativa de não perder o controle da informação no município”, diz.

Moraes ainda não apresentou sua defesa, o que deve acontecer nos próximos dias. Motivado pelo processo, Moraes criou um outro blog, o “Não aceito censura aos blogs”, no qual disponibiliza os processos movidos contra blogs no Norte e Noroeste fluminense.


Jornal da Imprensa, 19 de agosto de 2009

Os "caras" do companheiro Obama

ELIO GASPARI

Má notícia para a torcida do companheiro Obama.

A jornalista americana Michelle Malkin botou na rua o livro “Cultura da corrupção — Obama e seu time de pilantras, sonegadores e cupinchas” e em apenas uma semana ele ocupou o primeiro lugar da lista de mais vendidos do “The New York Times”. No chute, isso significa uma circulação de 50 mil a 100 mil exemplares. Como John McCain teve 60 milhões de votos, esse número ainda não é motivo para se arrancar os cabelos.

Malkin bate pesado, mas cada adjetivo é acompanhado por fatos. Ela lista os maus passos de algo como 50 estrelas do firmamento de Obama.

Pilantras? Bill Richardson, seu secretário do Comércio, desistiu da indicação por conta das investigações a que estava submetido. (Noves fora o pecado venial de maquiar o currículo esportivo, como o vice Joe Biden, que maquiara o acadêmico.) Uma ONG dirigida por Patrick Gaspard, atual diretor da seção de assuntos políticos da Casa Branca, tomou a terceira maior multa já aplicada a malfeitorias eleitorais, US$ 775 mil.

Sonegadores? O senador Tom Daschle desistiu de ser secretário da Saúde por má contabilidade tributária.

Foi substituído por Kathleen Sebelius, que errou as contas com a Receita em três anos sucessivos. Timothy Geithner, secretário do Tesouro, esqueceu de pagar US$ 43 mil dólares ao Imposto de Renda.

Cupinchas? A mulher mais poderosa da Casa Branca, depois de Mme.

Obama, é Valerie Jarrett, amiga e guia do casal na política e na cleptocracia dos democratas de Chicago. Ela é sobrinha do poderoso lobista Vernon Jordan, que arrumou um emprego para Monica Lewinsky, tentando mantê-la de boca fechada.

Todos os episódios e culpas narrados em “Cultura da corrupção” já apareceram na imprensa ou na blogosfera.

Malkin montou o painel, usou tintas fortes e mostrou uma paisagem onde se misturam velhas figuras de Wall Street, companheiros sindicalistas truculentos e vorazes, com ONGs tisnadas por escroques. Isso e mais Chicago, o berço político de Obama, uma espécie de Maranhão rico e industrializado. Malkin demonstra que o discurso antilobista de Obama estava mais para lero-lero. (O procurador-geral Eric Holder é lobista registrado, como o secretário da Agricultura e, de certa forma, o diretor da CIA.) A retórica da transparência, prometida durante a campanha, foi esquecida em poucas semanas.

Na mão da xará, Michelle Obama come o pão que Asmodeu amassou.

Malkin mostra que sua secretária social ganhou US$ 1 milhão trabalhando para duas companhias de gás no ano da graça de 2008, o da eleição. A carreira profissional de Michelle tem duas lombadas. Ela foi contratada pelo Centro Médico da Universidade de Chicago para um cargo que não existia, extinto com sua saída. Mais: quando o marido era um político promissor seu salário ficou em US$ 122 mil anuais. Depois que ele se elegeu senador, subiu para US$ 317 mil.

Com menos de um ano de governo, só a má vontade pode instruir a suspeita de que a qualquer momento surgirá o neologismo Obamagate. Nada aconteceu na Casa Branca que possa lembrar a licenciosidade de John Kennedy, a paranoia de Richard Nixon, a plutofilia do casal Clinton ou o imperialismo irresponsável de George W. Bush. Contudo, se algo parecido acontecer, o livro de Michelle Malkin será lembrado. Ela avisou.


Globo & Folha, 19 de agosto de 2009


August 16, 2009

Uma saída para Sarney

JOSÉ ROBERTO TORERO


CARO EX-PRESIDENTE da República e atual presidente do Senado José Sarney, é possível que nos próximos dias o senhor perca seu cargo. Acho isso difícil, já que os seus companheiros são muito, digamos, compreensivos com os erros alheios. De qualquer forma, pode ser útil já ir pensando num novo trabalho, e é por isso que lhe escrevo. O desemprego é uma coisa triste e não o desejo a ninguém. Ficar em casa vendo TV seria muito ruim para uma pessoa tão ativa. E escrever seria pior ainda. Para todos.

Por isso, examinei atentamente sua história recente e me pus a pensar qual profissão seria mais indicada a Vossa Excelência. Cheguei a uma interessante conclusão: a saída é tornar-se presidente de um clube de futebol.

As vantagens são imensas. A primeira e mais óbvia é continuar a ser chamado de "presidente". É um termo que afaga o ego, que satisfaz a vaidade, que vicia. Afinal, o presidente é aquele que está acima de todos, que manda em tudo, é aquele que tem o poder.

Mas há outras coisas boas. Por exemplo, não há que prestar contas a ninguém. Sim, às vezes existe um conselho fiscal, um grupo de diretores ou coisa assim, mas é muito raro que eles criem problemas.

Geralmente são do seu próprio grupo. No futebol, o fato de Vossa Excelência receber irregularmente um auxílio-moradia de R$ 3.800 seria deixado de lado.

Para algumas das tarefas do presidente do clube, o senhor estaria mais que gabaritado. Eles adoram, por exemplo, mudar os estatutos para poderem governar por mais tempo. E não podemos esquecer que Vossa Excelência, quando mandatário máximo do país, conseguiu prorrogar seu mandato em mais um ano.

Muitos presidentes também adoram misturar suas coisas particulares com as do clube. Às vezes, o dinheiro, às vezes os funcionários.

Assim, por exemplo, não haveria problema em que o mordomo da casa da sua filha Roseana fosse pago pelo Senado.

As prestações de contas dos clubes também são um tanto obscuras e imprecisas. Assim sendo, os boletins administrativos secretos seriam uma inovação muito bem-vinda ao futebol. Neste caso, a publicação de coisas como a nomeação de seu neto João Fernando, de sua sobrinha Vera Portela ou mesmo do namorado de sua neta para integrar o quadro de servidores do Senado não causaria problemas.

Mas há mais coincidências entre os dois empregos, muitas mais. Li que a Fundação Sarney recebe um bom dinheiro de empresas estatais como a Petrobras, que repassou R$ 500 mil para patrocinar um projeto cultural que nunca teria saído do papel. Pois os clubes, mesmo devendo uma nota preta, recebem uma boa grana da Timemania.

Também é muito comum entre os dirigentes esportivos que amigos tornem-se inimigos e vice-versa. Ora, Vossa Excelência está mais que acostumado com isso. Antes, tinha Lula e Fernando Collor na conta dos adversários ferrenhos. Hoje, são fiéis companheiros seus. Nos clubes e na política, nunca se diz nunca.

Enfim, fica aqui o conselho: caso o Senado o dispense, sempre há o futebol.

Folha, 11 de agosto de 2009


August 14, 2009

Vida descarrilada

JOSÉ GERALDO COUTO



Pedrinho, que pendurou as chuteiras anteontem, foi vítima da cultura da truculência e da estupidez


UMA SEMANA depois de o argentino Juan Pablo Sorín anunciar sua aposentadoria, desligando-se do Cruzeiro, agora quem pendura as chuteiras é Pedrinho, ex-Vasco, ex-Palmeiras e ex- -uma porção de times do Brasil e da Arábia. Sorín tem 33 anos. Pedrinho acaba de fazer 32.
Ao anunciar a rescisão de seu contrato com o Figueirense e a decisão de abandonar os gramados, Pedrinho tinha o ar de um pugilista que, depois de muito apanhar, joga finalmente a toalha.

Segundo o agora ex- -jogador, acabou a paciência dele próprio e das pessoas à sua volta com suas sucessivas contusões, que há anos o impediam de exercer com eficácia o seu ofício.

Dono de um enorme talento, Pedrinho conviveu durante a maior parte da carreira com o estigma mais terrível que pode pesar sobre um futebolista profissional, o de "bichado". Os torcedores dos clubes pelos quais atuou alternavam um carinho quase paternal por ele com momentos de desconfiança, quando não de irritação. Já os adversários só vinham com ironia e crueldade.

O fato é que ninguém nasce "bichado". O calvário de Pedrinho teve início numa data precisa. Em 6 de setembro de 1998, num jogo pelo Vasco, dois dias antes de se apresentar à seleção, uma entrada violentíssima de um certo Jean Elias, do Cruzeiro, rompeu o ligamento cruzado anterior de seu joelho direito.

Aos 21 anos, Pedrinho vivia seu melhor momento. Tinha sido decisivo para a conquista da Libertadores daquele ano pelo Vasco. Jogaria pela primeira vez na seleção. Um único pontapé fez sua biografia tomar outro rumo, como um trem que descarrila. Nunca mais retornaria aos trilhos certos. A vida que poderia ter sido estava perdida para sempre.

Num de seus vários retornos, depois de uma cirurgia e da penosa recuperação subsequente, viveu uma cena que julgo emblemática.

Era a final da Taça Guanabara de 2000. Pedrinho, que tinha feito o último gol na goleada de 5 a 1 do Vasco sobre o Flamengo, recebeu uma bola junto à lateral do campo e a conduziu pelo alto em direção à área adversária. Uma "embaixadinha" em movimento, em suma.

O gesto, que expressava sua alegria por voltar a jogar e a vencer, despertou a ira rubro-negra. O zagueiro Juan deu-lhe um carrinho criminoso, vários flamenguistas avançaram contra ele, o tempo fechou.

À beira do campo, o então técnico do Vasco, Abel Braga, apressou-se em dizer ao treinador adversário que apoiava a agressão flamenguista a Pedrinho, pois este tinha ferido a assim chamada "ética" dos boleiros, que proíbe a "provocação". Na TV, locutores e comentaristas engrossaram o coro de censura a Pedrinho. Só faltou gritarem: "Lincha".

Naquele momento ficou claro, para mim (e certamente para Pedrinho), que vivemos sob o império da truculência e da estupidez. "Neste país é proibido sonhar", escrevera Drummond seis décadas antes.

Em outubro de 2002, em outro de seus renascimentos para o futebol, Pedrinho, então no Palmeiras, foi pego no antidoping, por conta do antidepressivo que tomava.

Esclareceu-se depois que o remédio era ingerido com a anuência da CBF. Pedrinho, afinal, tinha motivos de sobra para se deprimir.

Folha, 8 de agosto de 2009

August 13, 2009

Produtos eróticos com selo verde ganham as vitrines

Cresce o mercado para lingerie, cremes e brinquedinhos ecológicos

Que a revolução verde está tomando conta de vários segmentos, todo mundo sabe. Pois, agora, é a vez dos produtos eróticos ecologicamente corretos.
Apesar de ainda representarem uma fatia pequena dentro da dimensão do mercado do sexo — que no Brasil já movimenta anualmente R$ 900 milhões, com crescimento médio na ordem de 10%, segundo dados da Associação Brasileira das Empresas do Mercado Erótico (Abeme) —, peças produzidas com materiais biodegradáveis ou recicláveis começam a chegar ao país e representam uma boa oportunidade de negócio.
Algumas dessas novidades poderão ser conferidas na 15aedição da Erótika Fair, que acontecerá de 9 a 12 de outubro no Mart Center, em São Paulo. O evento comporta até 40 expositores e tem atraído em média 20 mil visitantes por edição, sendo 10% do público voltado para negócios.
Além de inovações tecnológicas — como o masturbador masculino japonês Tenga (que conta com três velocidades e forças de sucção diferentes) e a 3ageração do OhMiBody, que vibra de acordo com som ambiente —, o evento trará opções criativas na área sustentável.

Vibrador com selo do Greenpeace

— Há uma nova geração de empresários do ramo preocupados com a questão ecológica. Percebemos o uso de tecidos e bases cosméticas naturais substituindo as sintéticas, que são de difícil decomposição. Nesse contexto, entram as roupas íntimas feitas com fibra de bambu e as loções e cremes com óleos vegetais, ao invés de derivados de petróleo — diz Evaldo Shiroma, organizador da feira e presidente da Abeme.
Boa parte desses artigos ainda não ultrapassaram as fronteiras da Europa e dos Estados Unidos. Mas nem por isso empresários do ramo têm desistido de investir no segmento.

— As pesquisas e os produtos que já existem no mercado aliam preservação do meio ambiente com o bem-estar promovido por materiais inovadores, mas muitos ainda são trazido lá de fora — informa Shiroma, acrescentando que 70% dos produtos eróticos comercializados no Brasil hoje são importados.
Na loja Over Sexy, no shopping Città America, Barra da Tijuca, os mais antenados já encontram os vibradores da marca sueca Lelo, que aposta em materiais não tóxicos e formatos inspirados nas curvas femininas. A preocupação com a sustentabilidade está no uso de baterias internas recarregáveis, que dispensam pilhas. Dependendo do modelo, o preço pode chegar a R$ 1.573.
Há no mercado, ainda, chibatas de couro ecológico (R$ 60) e lingerie com fibra de bambu (R$ 90), que possui alta elasticidade e ainda é anti-bacteriológica.
Para garimpar novidades, a proprietária da Over Sexy, Izabela Berg, frequenta feiras e eventos internacionais.

— Acaba de ser lançado na Irlanda um vibrador que não utiliza bateria e tem o selo do Greenpeace. Para fazer vibrar é preciso “dar corda” manualmente.
E o mais legal é que a potência que não é utilizada fica armazenada — explica a empresária, que também é apresentadora do programa “Boa de cama”, do canal Sexy Hot, onde dá dicas sobre brinquedinhos eróticos.
Ralf Furtado, gerente comercial da A2 Conveniências Eróticas, em Ipanema, também não abre mão de viajar para conhecer as tendências do mercado. De malas prontas para visitar a StorErotica 2009, no mês de setembro, em Las Vegas, o empresário aposta na comercialização de óleos de massagem vegetais e biodegradáveis — que diferentemente dos minerais não obstruem as glândulas de excreção e são menos poluentes (R$ 69,70) — e vibradores feitos de cyberskin (R$ 457,90), que imita pele humana e não tem ftalato (composto difícel de ser biodegradado).
A loja vende até um consolo de vidro (R$ 529,70), que é hipoalergênico e pode ser reciclado diversas vezes, diferentemente do plástico.

— Como utilizam tecnologias diferenciadas, os produtos eróticos sustentáveis ainda têm custo de fabricação mais elevado, o que aumenta em pelo menos 30% o valor de venda. A procura ainda é pequena, pois os brasileiros ainda não estão ligados no assunto. Por isso precisamos chamar a atenção para o negócio de formas inteligentes — afirma Furtado.

Lingerie feita de látex ecológico

Antenada com a nova tendência, a empresária Suzana Leal, da Pselda, vai usar na próxima coleção um tecido ecológico feito de látex sustentável — extraído sem causar danos à natureza — para fazer leggings, sutiãs e calcinhas.
Parece couro sintético, mas a diferença é que não agride o meio ambiente.

— Aqui, essa preocupação faz parte da rotina. Nossas embalagens são ecobags, e os saquinhos de calcinhas são de filó.


O Globo, 9 de agosto de 2009

VOLTAR PARA O BLOG0NEWS



Musa pornô vira caso de segurança nacional

Governo indiano usa lei para tirar da internet primeira HQ do gênero no país

Florência Costa

NOVA DÉLHI. Com seus longos cabelos negros, seu sári colado ao corpo curvilíneo e um apetite sexual insaciável, a bela dona de casa indiana Savita Bhabhi era a maior inspiração das fantasias sexuais de milhões de indianos. Ela nasceu há um ano, ganhou vida na internet e se transformou na primeira estrela pornô em quadrinhos online da Índia. Mas Savita ganhou um poderoso inimigo: o governo do país a considerou obscena e inaceitável. Assim, as aventuras sexuais dessa “cunhada” indiana — o sobrenome Bhabhi significa mulher do irmão mais velho — chegaram ao fim.

O mais curioso foi que o governo decidiu exterminar a estrela pornô valendose de uma lei usada para casos de segurança nacional, decretada após o ataque terrorista ao sistema de trens de Bombaim em 2006. A legislação permite ao Estado censurar sites que ameaçam a integridade do país e possam perturbar as relações de amizades da Índia com os países vizinhos.

“O que Savita fez para merecer isso?”, era a chamada de um dos muitos artigos da mídia indiana sobre o assunto. Os tradicionalistas acusaram Savita de ser um atentado contra os valores mais arraigados da conservadora sociedade hindu. O flerte com a cunhada mais velha é tema tradicional na cultura popular indiana.

Savita era um símbolo de pensamentos impuros, sonhos sexuais, fantasias, infidelidade. Ela seduziu os indianos: o site atraiu 60 milhões de pessoas por mês, 70% dos quais indianos.

A cada dia havia uma nova história no site. Mesmo casada, ela tinha escapadas sexuais com vários homens: vendedores ambulantes, adolescentes e até juízes de concurso de miss. Um dos últimos episódios mostrava-a seduzindo um personagem que lembra o ator Amitabh Bachchan, ícone de Bollywood.

O autor do quadrinho erótico é um empresário britânico de origem indiana, Puneet Agarwal, de 38 anos. Ele explicou que sua intenção era mostrar a sensualidade das mulheres indianas: — Elas também têm desejo sexual.

Os que criticaram a censura alegam que outros sites pornôs continuam no ar, mesmo com a pornografia proibida no país. Então por que o governo aplicou a lei somente com relação a Savita? A sedutora cunhada usava todos os adereços de uma indiana típica: o sári, o bindi no meio da testa, o mangalasutra (colar que sinaliza o status de casada). Há quem aposte que foi por isso mesmo — por simbolizar a sociedade indiana — que ela acabou vítima da pena de morte.

A vida breve e a morte repentina de Savita provocaram um debate sobre a reprimida sexualidade na terra do Kama Sutra, o milenar tratado erótico indiano.

Para alguns, o episódio revelou a problemática relação dos indianos com o sexo. Muitos achavam que Savita era um símbolo de liberdade, poder e sexualidade da reprimida mulher indiana.

— Isso mostra que somos uma sociedade hipócrita e sexualmente reprimida, ainda que tenhamos monumentos como Khajuraho, com pedras esculpidas há milênios com cenas eróticas — disse o publicitário e comentarista de TV Suhel Seth.

Logo após a censura, no início de junho, o criador de Savita organizou uma campanha de ressurreição de sua criatura: “Salve Savita online”. Foi um sucesso. Mas, na semana passada, o empresário jogou a toalha. Nem ele teve forças para resistir à pressão da conservadora família indiana: — Lamento os problemas causados a todos os blogueiros e fãs que apoiaram essa causa. Questões pessoais e familiares me obrigam a encerrar essa campanha — publicou Punnet Agarwal recentemente em sua página.

O Globo, 9 de agosto de 2009

VOLTAR PARA O BLOG0NEWS

August 8, 2009

Elenco da chanchada

RUY CASTRO

RIO DE JANEIRO - No tempo em que se exigia menos postura e mais compostura dos nossos homens públicos, a sociedade dispunha de certos instrumentos de controle das instituições: o teatro de revista, as marchinhas de Carnaval e as chanchadas. Eram de fulminante agilidade, poder de crítica e penetração popular.

Os últimos arranca-rabos no Senado, por exemplo, caberiam à risca nas chanchadas. Mas quem interpretaria quem? O problema dos grandes comediantes, como Oscarito, Zé Trindade e Ankito, é que sua natural bonomia, que os tornava tão adoráveis, era incongruente com a agrestia dos políticos. Nenhum deles poderia ter interpretado, digamos, o senador José Sarney.
O único ator capaz de viver Sarney com realismo seria Chico Anysio, o que ele já mostrou com o personagem do político Justo Veríssimo, que criou na TV há 25 anos. Para isso, bastaria trocar o bigode tipo escovão de Justo pelo de Mazzaropi, no qual, pensando bem, o próprio Sarney pode ter-se inspirado quando se lançou na política nos anos 50.

Outro senador, Renan Calheiros, ficaria bem nas mãos de Wilson Grey. Não por qualquer identidade física, mas porque, assim como não havia chanchada sem Wilson Grey -não importava o estúdio ou o enredo-, não se concebe um governo sem o apoio de Renan Calheiros. E quem melhor que o rodriguiano Fregolente como Tasso Jereissati?

Quanto ao senador Fernando Collor, nenhum dos antigos vilões das chanchadas, como José Lewgoy, Renato Restier ou Jece Valadão, seria capaz de reproduzir o olhar açulado, quase hidrófobo, injetado de cólera, de Sua Excelência. O jeito seria escalar um ator com certa semelhança de traços, mas que, pelo contraste entre suas personalidades, obrigasse a plateia a construir o personagem. Ronald Golias, quem sabe?

Folha, 7 de agosto de 2009

August 6, 2009

Público disperso pede mais sexo e menos papo

Por MATT RICHTEL

A atriz conhecida como Savanna Samson costumava se preparar com cuidado para um papel. "Eu não via a hora de receber meu próximo roteiro", ela disse.

Hoje não há mais motivo para olhar para eles, porque seus filmes pedem exclusivamente ação, ela explica. Especificamente, sexo.

A indústria de filmes pornográficos há muito tempo tem apenas um interesse casual por tramas e diálogos. Mas, atualmente, os cineastas se concentram ainda menos nas narrativas. Filmam mais cenas curtas que podem ser facilmente enviadas para sites na web e vendidas em trechos de alguns minutos.

"Na internet, o período de atenção médio é de 3 a 5 minutos", disse Steven Hirsch, copresidente da Vivid Entertainment. "Temos de atender a essa demanda."

A Vivid é um dos mais proeminentes estúdios de pornografia e faz 60 filmes por ano. Três anos atrás, quase a metade deles eram longa-metragens com roteiros. Hoje, mais da metade é uma série de cenas de sexo ligeiramente interligadas por alguma "vinheta" -no jargão da indústria-, que podem ser apresentadas separadamente on-line. Outros grandes estúdios estão adotando mudanças semelhantes.

O interesse da indústria por cenas com diálogos diminuiu muito nas últimas décadas por causa das mudanças tecnológicas. No início da década de 1970, filmes com roteiros vagos como "Garganta Profunda" e "Por Trás da Porta Verde" conquistaram o grande público, e outros tentaram copiar seu sucesso, vendendo filmes com roteiro para os casais assistirem em casa em vídeos -com a tecnologia VCR lançada em 1975.

A queda do preço das câmeras de vídeo portáteis deu origem a uma geração de pornógrafos com pouco interesse pelo drama além de uma trama clichê envolvendo um entregador de pizza, disse Paul Fishbein, presidente da publicação setorial "AVN Media Network".

Segundo Fishbein, a trama entrou novamente em moda no final dos anos 90, com o sucesso do DVD. Os grandes estúdios, segundo ele, imaginaram que as tramas tornariam seus filmes mais atraentes para as mulheres e incentivariam os casais a levá-los para casa -em discos ou em pay per view.

Mas o interesse pelos DVDs caiu acentuadamente, disse Fishbein, porque a internet facilitou assistir a pequenos vídeos, ou snippets.

Em vez de tramas, há temas. Entre os novos lançamentos da New Sensations, estúdio que faz 24 filmes por mês, está "Girls in Glasses", feito de cenas de mulheres que fazem sexo usando óculos.
"É quase como se tivéssemos voltado ao final dos anos 70 ou início dos 80, quando um filme médio durava oito minutos e tinha apenas uma cena de sexo", disse Hirsch, parecendo desanimado.

Savanna Samson disse que gostava de atuar seriamente e se preparava com afinco para seus papéis. "Eu costumava ter diálogos", disse a atriz, cujo nome real é Natalie Oliveros e é uma das maiores estrelas do setor. "Fazer uma cena hardcore depois da outra não é tão divertido", acrescentou.

Folha, 3 de agosto de 2009


Carta ao último exilado

DAVID LERER

Neguinho, você foi o último exilado a voltar. Eu fui o primeiro. Tenho 30 anos a mais de experiência. Assim, envio instruções básicas

DEPOIS DE quase 40 anos vivendo na Suécia com identidade falsa, o ex-marinheiro Antônio Geraldo da Costa, 75, o Neguinho, desembarcou no Aeroporto Internacional Tom Jobim, no Rio de Janeiro, no último dia 21. Em vez de agentes da Polícia Federal prontos para prendê-lo, encontrou um emissário enviado pelo Ministério da Justiça para lhe dar as boas-vindas. Neguinho foi o último exilado a voltar.

Eu fui o primeiro, logo que o AI-5 acabou. Portanto, tenho 30 anos e meio a mais de experiência de Brasil do que o Neguinho, razão pela qual estou lhe encaminhando uma carta com algumas instruções básicas.

Companheiro Neguinho,
Em primeiro lugar, muita calma. Se você for convocado para um ato secreto em Brasília, não se apavore pensando que é uma sessão de porrada ou choque ou para ser pendurado no pau de arara, como nos velhos tempos.

Ato secreto pode ser o meio pelo qual um senador, que pesquisou e descobriu ser teu parente, está tomando as providências para lhe arrumar um emprego de, por exemplo, "encarregado professor adjunto de Nós Náuticos e diretor das Embarcações do Senado no Lago Paranoá", dada tua condição de marinheiro.

Outra palavra chave é "anistia". Se algum advogado chegar falando baixinho que você tem de "pegar tua anistia", não vá estranhar e responder, todo orgulhoso, que já está anistiado -embora isso seja tanto verdade que você está andando de um lado para o outro sem problemas.

Não terá sido bem isso o que o doutor quis dizer. Essa expressão "pegar tua anistia" significa mesmo ganhar uma grana -e o doutor, claro, leva algum com isso. Tem jornalista que levantou 1 milhãozinho só porque, depois do golpe, perdeu um emprego que nem tinha nada a ver com o golpe.

Aliás, é pena que você tenha sido da Marinha, e não da Petrobras. Se você fosse da segunda, eu até iria sugerir que me convidasse para o churrasco em comemoração. Você nem imagina a grana que essa turma levantou. É bem mais preta do que o petróleo.

Mudou tudo, compadre.

Agora nós é que estamos por cima. Ou melhor, só alguns de nós, uma meia dúzia, se muito. Exagerando, talvez um pouco mais. O resto continua pastando, inclusive o povão. "Povão" é o que a gente chamava antigamente de "massa atrasada".

O presidente Lula é o primeiro da lista. Há uns 40 anos, era torneiro mecânico. Depois entrou no sindicato como sub do sub, foi subindo, subindo... e não quis mais saber de outra vida. Fala qualquer coisa, parece entender de tudo e todo mundo acha graça. É um talento.

Outro é o José Serra. Foi presidente da UNE quando você era vice-presidente da Associação dos Marinheiros e Fuzileiros Navais, agora governa São Paulo e, de repente, pode ser eleito para a vaga do Lula.

Tanto o Serra quanto o Lula têm o apoio daquela turma que queria ver a gente enforcado.
Mas, em vez do Serra, o Lula prefere a Dilma, outra ex-companheira. Essa você não conheceu, veio depois de nós, mas é esperta, menino, você precisa ver. Tem currículo para tudo. Precisa de guerrilheira? Ela tem. Torturada? Tem. Doutora? Também tem currículo. Nem sei como conseguiu fazer tanta coisa e mais ainda o serviço de casa.

Outros que foram da pesada e estão se dando bem são o Carlos Minc, que tem a chave da Amazônia, e o Franklin Martins, que tem a chave do cofre da mídia.

Falando em cofre, toda essa turma "fez" o cofre do Adhemar. Esse item é parte importante do currículo. Pega bem porque, afinal, o Adhemar era tido como ladrão. E, pelo número de companheiros que "fizeram" o cofre dele, parece que aquilo nem foi assalto, mas um show da Madonna.

É, companheiro, as coisas mudaram.

Quer um conselho: dá uma de Gabeira, faça como ele, que também veio da Suécia, e escreva um livro do tipo "O Que É Isso, Companheiros?" -"companheiros", assim mesmo, no plural-, sobre o que você está vendo de diferente, de estranho, e espere um pouco. De repente, você até se dá bem. No ano passado, Gabeira quase se elegeu prefeito do Rio de Janeiro e agora já o convidam para tentar o governo do Estado.

Enquanto nada disso acontecer, venha me visitar em São Sebastião, onde moro atualmente. Aqui tem peixe, pinga, porto e mulher bonita. Tudo de que a gente precisa. Tenho um barco velho com motor de caminhão que vivo reformando, mas dá para pegar umas garoupas e sororocas.
Vamos fazer umas pescarias. E falar mal do governo, porque eu estou onde sempre estive: na oposição.

Você sabe, Neguinho, o lugar de um homem que se preza é na oposição.

Aquele abraço,

DAVID LERER , 71, é médico, ex-deputado federal pelo extinto MDB, cassado na primeira lista do AI-5, em dezembro de 1968, viveu exilado em países da América Latina, da África e da Europa.

Folha, 31 de julho de 2009

August 5, 2009

Cansados de matar e morrer



por Zuenir Ventura

Volto a falar de dois tocantes personagens que estiveram há pouco no Rio, e da organização em que militam: o Fórum das Famílias Enlutadas, movimento que trabalha pela paz e a reconciliação no Oriente Médio.

Como pertencem a povos em guerra há mais de meio século, eles tinham tudo para ser inimigos, mas são amigos. Ela, a israelense Robi Damelin, teve um filho assassinado pelos palestinos; ele, o palestino Ali Abu Awwad, perdeu um irmão executado por soldados israelenses. Conversei com os dois e os vi no documentário “Ponto de encontro”, da brasileira Julia Bacha. A conversão de ambos à causa da não violência — eles e mais 500 famílias, 250 de cada lado — é uma experiência inédita. Não sei de superação emocional maior do que essa de transformar o ódio pelo assassinato de um filho ou irmão numa ação positiva.

Afinal, como diz Robi, a dor da perda lhes deu “o direito de odiar”. Ali igualmente poderia ser considerado um “herói” pelos seus, tendo passado o que passou: “Levei um tiro, fiquei preso quatro anos, perdi um irmão. Tudo isso me daria credibilidade para estar espalhando o ódio junto a meu povo.” Por que preferiram a opção oposta? Ela responde: “Para dar algum sentido ao sofrimento e evitar que outras mães sofram o mesmo.” E também por que não tentar a paz, se a guerra se revelou incapaz? Este argumento talvez seja mais convincente para conquistar adeptos do que as razões humanitárias. Calcula-se que a cada 24 horas cerca de 20 famílias israelenses e palestinas perdem um parente para a violência. Assim, por cansaço de matar e morrer, muitos aderem à causa para romper o círculo vicioso em que um lado atribui a culpa ao outro.

É o caso do veterano do Exército que perdeu a filha adolescente num atentado terrorista. Ou do palestino cuja filha de 12 anos teve o mesmo fim.

Um ano depois, eles ingressaram no movimento e agora dão palestras em escolas. Quando dois inimigos históricos aparecem juntos falando a mesma língua da concórdia, algum efeito positivo se produz na cabeça dos jovens. Num desses encontros, o ex-militar fala a um aluno descrente: “Franceses, alemães e ingleses se odiavam e se matavam.

Hoje, vivem em paz, sem fronteiras. Isso vai acontecer conosco, quer você goste ou não.” Alguém replica: “Todo judeu entra para o Exército, e você acha que eles querem paz?” Resposta: “Por isso mesmo muitos querem.” Quando se duvida da eficácia de sua campanha, como ingênua, Robi cita o exemplo da África do Sul, onde nasceu, e de Mandela, de quem é discípula.

Ela está convencida de que fazem algo semelhante ao que foi feito contra o apartheid — “é aquele trabalho de formiguinha que preparou o terreno para quando Mandela saiu da prisão. Parecia inútil”.

Pelo menos em dois aspectos, ela lembra seu ídolo: na capacidade de perdoar e na determinação de promover a paz.

O Globo, 5 de agosto de 2009

August 3, 2009

Se todo mundo fizer o correto, vai desmontar o setor

A economia interna do setor cultural é toda montada nisso (em notas de favor).

Quando você vai contratar o contrarregra, a camareira, o operador de luz, o cara que constrói o adereço, como eles não são pessoa jurídica compram nota dessas empresas.

Se você for pagar com RPA — prestação de serviço — tem que descontar Imposto de Renda, INSS etc.

Até três, quatro anos atrás, a gente não conferia a procedência da nota, por falta de informação. Hoje, quando chega uma nota fiscal, a gente confere. A gente tira certidão negativa de dívida de INSS e vê o contrato social.

Houve uma profissionalização obrigatória no setor.

Hoje em dia não dá mais para ser como era, porque vai ter análise pelo MinC e depois pelo Tribunal de Contas.

Mas não posso ter uma investigação sobre a procedência da nota. Preciso é saber se a pessoa está apta a prestar o serviço daquela função e se a empresa não está devedora do INSS. Muitas vezes chegam notas que nem sabemos que são compradas.

Lembro de um diretor famoso que tinha empresa, mas não queria dar nota fiscal dele.

Então ele comprou. Depois ele descobriu que era fria, o endereço era de um salão de beleza. E ainda por cima no lugar funcionava uma gráfica. Recebi essa nota, mas na época, há oito anos, eu não tinha ideia de que poderia receber uma nota fria.

Essa conferência que nós, produtores, fazemos dá muita brigalhada. Às vezes, são mais de 500 pagamentos no universo de uma peça. Só vou pagar quando vir o contrato social e depois de tirar a certidão do INSS. Isso pode demorar dias.

O contratado reclama, xinga, diz: “Seu bandido, não está me pagando.” Tem gente que acaba pagando logo a esse sujeito, por não aguentar mais a reclamação.

O produtor quer se resguardar, e o contratado quer receber logo e pagar menos imposto. Ele acaba o trabalho dele e quer receber imediatamente.

O grande problema é o caso de técnicos, costureiros, camareiras etc, mas há alguns artistas renomados e diretores famosos que também compram nota. Muita gente conhecida nacionalmente compra nota.

Com essa alta tributação, o setor não tem como se formalizar.

E é preciso a formalização.

A solução é o setor todo poder ser Supersimples. Além disso, abrir uma empresa custa caro, e é preciso pagar contador todo mês. Como é que um operador de luz vai poder fazer isso? Teria que ter uma forma diferenciada para essas profissões técnicas ou então se formarem cooperativas.

Não dá para entender o produtor que contrata essas empresas para receber patrocínio.

É uma burrice, o dinheiro vai para a conta dessas pessoas, e quem garante que vão repassar? Só se empresa dele estiver inabilitada no MinC. Ou então só se não tiver lei de incentivo.

Aí, se eu der a minha nota, pago 17,9%; mas se dou a nota de 6%, economizo.

O governo sabe que isso existe, mas, como não vê solução, deixa ficar dessa forma.

Sabe que é assim, mas, se todo mundo fizer o correto, vai desmontar o setor.

O Globo, 2 de agosto de 2009

VOLTAR PARA O BLOG0NEWS

Hip hop é compromisso

MV Bill

Semana retrasada fui surpreendido por denúncias irresponsáveis a meu respeito, numa tentativa de manchar minha imagem. Produziram um espetáculo aparentemente jornalístico que sugeria ser eu testa de ferro de empresas supostamente piratas, insinuando que desviei milhões de reais, quando não tenho sequer a minha própria empresa. E ainda tentaram induzir as pessoas a pensarem que o livro que escrevi era bancado por dinheiro público. O que é comprovadamente falso.

O fato de, numa relação comercial privada, eu usar uma mesma produtora que tem projetos com a Petrobras não permite a ninguém concluir que exista alguma triangulação, como não existe! Isso inclusive já foi confirmado pela própria estatal.

Só que miraram num alvo, mas acertaram no próprio pé.

O curioso é que, depois, foi descoberto que a empresa questionada é uma agência da área artística reconhecida no mercado, tanto que boa parte da respeitável mídia — inclusive a “denunciante” — recorre a seus serviços. Que ironia...

Mas para mim o caso não está encerrado, pois o fato de eu não ter absolutamente nada com essa história me motiva sim a contribuir para uma grande reflexão, aproveitando essa tentativa de maldade para trazer uma discussão de verdade.

Li muitos questionamentos e defesas de artistas sobre suas dificuldades para se manterem no mercado formal e legal. Li muito sobre o que hoje é quase um câncer que corrói praticamente todo o mercado cultural/artístico no Brasil: a necessidade de boa parte dos artistas e criadores precisarem de empresas que vivem da intermediação entre o patrocinador e a arte. Li sobre artistas que recorreram a essas agências culturais para formalizar seus shows que efetivamente ocorreram.

Para entender melhor esse problema procurei alguns profissionais da área tributária e, entre outras coisas, pude concluir que não existem dados sobre o impacto da cultura brasileira no PIB nacional, ou seja, não existimos formalmente.

Entendi que nós, profissionais autônomos, pagamos sobre o valor do serviço prestado 11% de INSS, 5% de ISS e ainda Imposto de Renda, de acordo com tabela. Além disso, todas as pessoas jurídicas que nos contratarem deverão recolher mais 20% sobre o total do cachê para o INSS, independentemente do valor do serviço, e ainda correr o risco de haver caracterização de vínculo empregatício.

Entretanto, não é vantagem para nenhum trabalhador permanecer no mercado informal, não há auxíliodoença, aposentadoria, e nem são garantidos os benefícios dos contratados com carteira: férias, gratificação de um terço do salário nas férias, descanso remunerado, décimo terceiro, pagamento de hora extra, FGTS etc.

Na verdade, um trabalhador informal acaba ficando à margem das estatísticas e da realidade da classe trabalhadora brasileira, lembrando que a categoria de trabalhadores de “carteira assinada” sempre se destacou como minoria. No caso de profissionais ligados à cultura, essa situação ainda piora quando observamos que, além do indiscutível excesso de tributos, possuímos algumas características que, de acordo com as regras do jogo, contribuem ainda mais para elevar o custo de uma possível contratação, como, por exemplo, o fato de que a maioria desenvolve suas atividades em horário noturno e aos finais de semana. Diante dessa realidade, podemos afirmar que, do ponto de vista financeiro, é praticamente impossível contratar um profissional da área cultural através de registro em carteira.

Outra característica é que as funções exercidas pelos profissionais ocorrem em períodos determinados e dificilmente são de ação continuada, inviabilizando sua contratação nesse formato.

Toda essa instabilidade obviamente intimida a abertura de empresas próprias, principalmente se pensarmos nas dificuldades para se abrir uma empresa e mantê-la em funcionamento neste país. E olha que nem estou falando dos artistas iniciantes, que em geral trabalham para divulgar, não por cachê, mas que estão submetidos às mesmas regras, incluindo pagamentos de músicos e todos os encargos inerentes à atividade.

Mas é bom deixar claro que as coisas ditas por mim não são motivos para burlar a legalidade; pelo contrário, ela precisa ser a nossa meta, sempre.

Tenho nítido que, como cidadão, espero sempre que o dinheiro público seja bem aplicado, mas não podemos esconder que quem trabalha no meio artístico acaba meio órfão, sem ter uma regulamentação própria para seguir, tendo que se adaptar a uma realidade que não é sua. Portanto, convido todos os que pensam cultura neste país, em especial os parceiros das secretarias e do Ministério da Cultura, para juntos levarmos essa discussão adiante, sem eleger um bode expiatório, mas sim construir uma nova lógica para a cultura brasileira.

De certa maneira, agradeço o mal que tentaram fazer comigo, pois a conclusão a que chego é que, ao mesmo tempo em que fiquei indignado por meu nome ter surgido num rolo que não me diz respeito, sinto muito orgulho por ser um artista/ militante discriminado por sua origem social, mas que está tendo mais uma vez a coragem e a responsabilidade de botar o dedo na verdadeira ferida da cultura brasileira.

O Globo, 2 de agosto de 2009